segunda-feira, 1 de junho de 2009

Ser ou não ser

Flammen & Citronen, de Ole Cristhian Madsen




Devem ser a dupla de dinamarqueses mais famosa, a seguir ao Rosencrantz e Guildenstern. Um tem nome de marca de carro, o outro tem nome da Frente de Libertação do Arquipélago da Madeira. O filme Flammen & Citroen, do dinamarquês Ole Cristhian Madsen dá-nos esta oportunidade rara de ver a história da ocupação nazi, através de um ângulo diferente daquele a que nos habituámos. Através do percurso destes dois heróis da resistência escandinava, descortinamos algo que costuma ficar de fora dos filmes.

E ficam por aqui as oportunidades raras. Porque tudo o resto são as oportunidades habituais. Temos um filme de género, igual a tantos outros, em que se fala de nazis, resistência, guerra, conspiração, espionagem e contra-espionagem... Estão lá todos os clichés, até os contrastes de cor, como nos antigos noir. Até a loura fatal, que é espia, agente dupla, e o ponto fraco dos heróis que se julgam mais invulneráveis. E estes dois heróis estão quase a roçar o estatuto de anti-heróis (que é, diga-se um estatuto muito mais interessantes), mas não chegam lá. Falta qualquer coisa, que nestes casos é tudo, que não faz baixar a ponte levadiça que permite às emoções transitarem, de lá para cá.

Flammen é o resistente mais incandescente, arrebatado e tem o cabelo ruivo. Citronen é o resistente mais sólido, é moreno, tem um casamento afastado, uma filha que nunca vê, e anda sempre lustroso, do cabelo ao queixo. Um é luz, outro sombra. Uma espécie de yin e yang escandinavos, em que um completa o que falta no outro.

Ambos fazem parte da luta armada e têm a incumbência de matar colaboracionistas dinamarqueses envolvidos com os alemães. Têm de se haver com os assassinos nazis, mas também com a sua consciência que os torpedeia com rebates. Ser ou não ser assassino, quando, na realidade, assassinam. Por isso têm dúvidas e hesitações. Não as suficientes para tornar ambivalentes as personagens. Não são nada hamletianos, estes heróis da Dinamarca. Flammen e Citroen não se erguem da rasura de figuras cinematográficas. Nem se elevam das duas dimensões do intrincado tabuleiro de xadrez, onde tudo se joga, e onde as peças não podem ser só brancas ou só pretas. Nem os reis, nem os peões. Mas a ver, claro.

2 comentários:

Sue Patrício disse...

Nem sequer sabia que existia uma resistência dinamarquesa. Será que também há histórias assim da resistência holandesa, sueca ou do liechenstein?

Ana Margarida de Carvalho disse...

Alguns posts mais abaixo, um filme sobre a resistência argelina (A Batalha de Argel, de Gillo Pontecorvo), comentado por Raúl Calado, na secção O Gosto dos Outros.
Ana Margarida de Carvalho