quinta-feira, 26 de março de 2009

Estas mulheres são do Norte

Corte do Norte, de João Botelho








O que diria uma anaconda a uma minhoca? – este era o título de uma história infantil, ou infantilizada, que eu escrevi em tempos, e que continuava com estes encontros inusitados, e diálogos difíceis: o que diria um pinguim imperador a um tucano? Mas se até estas inconciliáveis faunas são, afinal, provindas da mesma célula – explicou-nos Darwin como quem confessa um pecado - então, também se pergunta: O que diria Manoel de Oliveira a João Botelho? Provavelmente o inspirado superou a inspiração. Provavelmente, o Oliveirismo não é propriedade exclusiva... Nem o Agustinianismo é território privado...


Mas deixemos isso. Concentremo-nos antes noutra hipotética questão: o que diria Robert Mackee ao ver Corte do Norte de Botelho? Provavelmente, o guru do argumento internacional, para quem um bom filme se resume em três palavras - story, story, story – teria uma dos seus proverbiais irrupções de mau humor, talvez ficasse vermelho de irritação... Mas enfim nada que justificasse uma apoplexia...


Sem corte, e sobretudo sem norte, este é um filme em que os estados de espírito arrastam-se, de cena para cena, como se arrasta de geração em geração, aquele fatalismo seráfico, daquelas mulheres que são todas a mesma: Ana Moreira (que também é a imperatriz Sissi). A actriz muda de personagem como quem muda de vestido, e por mais que se passe na Madeira, naquelas paragens de clima ameno e estável, sente-se nortada por todos os lados. E a geada do Douro (ah, afinal tem norte). Aquelas mulheres não são madeirenses, aquelas são as mulheres do norte do costume, aristocraticamente perversas como Agustina as desenhava. Tem muito penasco, da zona norte da Madeira, muito pedregulho preto, a contrastar com o verde das algas e a seda dos vestidos, tem um baile bem filmado, uma boa fotografia, uma imperatriz austríaca, uma enforcada, um Almeida Garrett (Virgílio Castelo, uma voz off com má dicção, um Caravaggio, a Traviatta, umas hortênsias, algumas cenas interessantes, mas então - é a vez de Mackee interromper – e a história, a história, a história?

1 comentário:

Ladislau disse...

Desta vez pelo menos não fala de futebol... Cá para mim o Botelho anda a tentar redimir-se do pontapé na atmosfera que deu no Corrupção, assim como quem diz, eu também sei fazer filmes a puxar para o chato. Só que o remate saiu frouxo