Home, Lar doce Lar, de Ursula Meier
O filme divide-se em duas partes. Na primeira, acompanhamos o quotidiano de uma família bastante ruidosa, e muito lúdica. Os pais (a mãe é Isabelle Huppert), duas filhas adolescentes e um miúdo (Kacey Mottet Klein – e atenção que esta é uma interpretação infantil notável)...
Esta família não tem uma particularidade. Tem várias particularidades. A mais visível é a circunstância de viverem todos cinco numa casa isolada no meio da pradaria, mesmo junto à berma de uma auto-estrada, que nunca chegou a inaugurar. E aí a realizadora explora todas as potencialidades visuais e insólitas de ter uma família que ocupa com toda a exuberância um espaço a que não se costuma ter acesso. O filho rola por ali de bicicleta e de trotinete, ao fim da tarde reúnem-se para jogar hóquei no asfalto, gurdam os sapatos nos rails de protecção, suspendem-lhe a parabólica em cima, deixam espalhadas brinquedos, piscinas de plástico, cadeiras, bolas, patins naquele espaço imenso...
A outra particularidade desta família é usar a casa de banho como ponto de encontro. Enquanto as outras se reúnem na sala, ou na casa de jantar, esta reúne-se no WC. E tem os seus próprios rituais, os seus jogos, as suas rotinas, os seus códigos... Percebe-se que encontraram algures uma base de equilíbrio, que lhes assegura a funcionalidade.
Chegamos à segunda parte do filme. A abertura da auto-estrada é a ameaça, a infecção que pode destabilizar esta família. O primeiro carro, o primeiro ruído, as primeiras partículas de toxinas... A primeira medida: prender o gato. Vemos como é, afinal, instável o ponto de equilíbrio da funcionalidade desta família. Em breve ela vai perder o direito de fazer o seu próprio barulho.
Estavam isolados do mundo, mas o mundo espalha-se como crude num oceano. O mundo cerca-os, aperta-os, circunscreve-os. A opção da realizadora pelos planos fixos e por algumas câmaras à mão transmite-nos esta ideia de cerco, de claustrofobia, de bolha que pode rebentar a qualquer momento.
Face à ameaça, a família escolhe ficar, numa lógica de resistência passiva. Abandonar o lar doce lar está fora de questão. Eles encontraram a fertilidade na aridez do asfalto, criaram raízes no alcatrão. Têm direito ao seu chão, por mais impossível que seja. A auto-estrada começa a fragmentar as ligações, e a minar-lhes a coesão. Há uma espécie de muro de Berlim entre eles, um fosso da aldeia de Asterix... A família dá os primeiro sinais de colapso iminente.Em lugar de fugir, esta família encasula-se, fecha-se sobre si como um caracol, tenta poteger-se do ronco infernal e constante dos motores, das partículas poluentes. Dormem numa cama comunitária... Mas o mundo lá de fora infiltra-se, pelas frestas, através das paredes, por todas as frinchas, por todas as fendas. É uma luta inglória, uma casa contra o planeta Terra, uma família-David contra o mundo-Golias, só que na vida real a globalização engole e digere as suas pequenas ilhas dissonantes.
Agora temos uma família encurralada, já não se sabe se a ameaça vem de fora, ou de dentro. Com uma fotografia excelente (Agnés Godard), um extremo cuidado na composição dos planos, umas cores contrastantes, sempre acentuadas por um calor e sufoco omnipresente, a realizadora faz-nos entrar neste reduto disfuncional de uma família, que tenta resistir a todo o custo, como um enclave territorial, como uma Palestina ou mesmo uma Suíça, rodeada de países grandes e aglutinadores por todos os lados.
Algo nos remete para o surrealismo do Arranca Corações, de Boris Vian, aquela mãe, Clementine, que tenta proteger os seus três filhos gémeos, e resguarda-os do mundo, fechados dentro de um armário... Ou mesmo para o casulo de Julianne Moore, quando ela protagonizou a neurótica dona de casa, no filme Safe, de Tood Haynes. Tal como esta mulher descobre que tem uma alergia à poluição, aos ácaros, às partículas e ao mundo em geral, também esta família se vai desligando, e cortando as passagens – até as de ar.
A auto-estrada é uma passagem. Para esta família sitiada é um beco sem saída. O lar doce lar é agora um bunker, que começa a ter muito de tumular.
No final, há uma inversão da perspectiva. O ponto de vista era o da família que assistia ao mundo ruidoso, poluente e sujo a bloquear-lhes as saídas. Agora temos um travelling final, como se olhado de quem transita pela auto-estrada e, através do vidro do carro, repara na paisagem que desfila a 120 km/hora. E naquela insólita casa de janelas e portas emparedadas, mesmo na berma da auto-estrada. O verdadeiro on the road podia começar aqui.
kual era o kantor k tinha uma música k se chamava Live is a Highway? se kalhar servia de banda sonora para este movie, juntamente kom a do kapuchinho rouge ou dos 3 porkinhos. Eles komem tudop
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1 comentário:
kual era o kantor k tinha uma música k se chamava Live is a Highway? se kalhar servia de banda sonora para este movie, juntamente kom a do kapuchinho rouge ou dos 3 porkinhos. Eles komem tudop
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