quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Pouca-terra pouca-terra


A nova Vida do Sr O’Horten, de Bent Hame





A Noruega pode parecer tão exótica quanto a Roménia ou a Coreia do Sul. Tudo depende da perspicácia para revelar os pormenores mais excêntricos… enfim, excêntricos para os outros, claro está, elevados internamente a uma pertinência mordaz. Dito assim, até se leva a crer que falamos de uma comédia. Nada disso. Tanto ou tão pouco quanto um filme de Kim Ki Duk ou Corneliu Porumboiu. Ao contrário dos seus vizinhos escandinavos, a Noruega não conta na sua História com uma Bergman, um Dreyer, um Lars Von Trier que seja. Por isso, regra geral, a cinematografia norueguesa, o país com melhor qualidade de vida segundo as estatísticas, permanece misteriosa, assim como aquelas montanhas geladas a que chamam fiordes.

Do frio chega esta personagem fascinantes, que irrompe por entre as montanhas de neve, à proa da moderna locomotiva que conduz. Chama-se O’Horten, nome escocês: a Escócia fica apenas a algumas milhas marítimas, e este O’Horten, pela cara se diz, que noutros tempos seria um pescador, que fora ali parar em busca de bacalhaus e outros peixe graúdos que por ali nadam. Nos nossos tempos, é maquinista, profissão idealizada e mostrada como sonho mítico de crianças, tal como astronauta. O’Horten é um maquinista que faz a sua última viagem, de Oslo para Bergen e vice-versa, antes da reforma. É apresentado como homem de poucas palavras que não gosta de dar nas vistas e funcionário competente, ao ponto de ser agraciado com uma locomotiva de prata (uau!).

O argumento é minimalista, centrado nesta intrigante personagem, cheio de bons momentos, como o contraste claro escuro, a neve e os túneis onde o comboio se esconde. Funciona bem enquanto retrato na busca da essência da condição humana.

Chega-se a desenhar uma aura de crime, que não se concretiza, mas há sobretudo uma noção de invisibilidade, numa sociedade desconfiada e fria, dando ideia que, parte das acções do protagonista, servem apenas para se assegurar da sua própria existência. Bent Hamer, realizador experiente, não resiste ao final moralmente positivo, do encontro consigo próprio e com uma segunda vida feliz. Mas o espírito geral do filme, dentro das suas intermitências, permanece em tom de busca do Norte.

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