quinta-feira, 14 de maio de 2009

33 filmes pelo preço de um

Cada um o seu Cinema, 33 realizadores








Em 2007, assinalando o 60.º aniversário de Cannes, o mais famoso e prestigiado festival de cinema Europeu encomendou pequenas obras (máximo três minutos) a 33 grandes realizadores mundiais, sob o tema Cada um o seu cinema, procurando, acima de tudo, perspectivas heterogéneas que mostrem as singularidades e pluralidades da criação contemporânea. Literalmente, estão representados os quatro cantos do Mundo, da Oceânia ao Norte da Europa, da Ásia Menor à América do Sul. Mas também ambos os hemisférios do cérebro e as suas mais discretas ramificações.
Estas pequenas obras foram reunidas numa só sessão e assim, ao contrário do que costuma acontecer com as curtas-metragens, vai ter exibições regulares em sala, como se de um só filme se tratasse.
É pois, antes de mais, uma homenagem ao próprio formato curto – pelo qual grande parte destes realizadores começou e ao qual, a mote deste desafio, regressa de forma mais ou menos inesperada, mostrando que a curta-metragem pode e deve ser mais do que um tubo de ensaio para as longas. Têm tanta pertinência no cinema quanto os contos ou as pequenas narrativas na literatura.
Depois é uma belíssima e vasta homenagem ao próprio cinema, já que esse é o ponto de partida. O cinema vê-se ao espelho ou através dos jogos de espelhos, em que se reflecte no rectângulo mágico. O cinema auto-homenageia-se, parodia-se, comove-se e distrai-se.
Os 33 olhares sobre o cinema nunca podem ser vistos como um filme uno, nem como um mural colectivo. São vários egos aglutinados, seguindo de forma mais ou menos clara o estilos desenhados pelos seus autores em outras obras.
Manoel de Oliveira é o único português presente. E o que de forma mais clara pior entendeu o enunciado ou intencionalmente procurou subvertê-lo, com um filme anedota, muito surpreendente, sobre um hipotético encontro entre Krushov e o papa João XXIII. Um filme mudo. E recorde-se que Oliveira é o único cineasta em actividade que começou antes da invenção do sonoro.
Roman Poalnski talvez tenha sido o que mais desiludiu, optando por contar uma anedota que caberia nos mais sem graça programas humoristas da televisão.
Ken Loach foi o mais sarcástico, trocando o cinema pelo futebol. Wim Wenders ganhou o prémio da pertinência, ao mostrar a reacção de um povo africano a habituar-se à paz vendo um filme de guerra. Lars Von Trier fortemente perturbador na forma como se incomoda com quem o perturba. Theo Angelopoulos optou por um mui felliniano tributo a Marcello Mastroiani. Walter Salles tramou os tradutores numa homenagem a Cannes bem embolada. Gus Van Sant repetiu o beijo de Rosa Púrpura do Cairo. E os irmãos Gardenne ganharam o prémio do filme mais comovente.
E houve vários cinemas paraíso, muita gente a fumar nas salas, dois cegos a assistir comovidos e dois furtos infrutíferos. Moretti foi intimista, Elia Suleiman um excelente clown, e, mais uma vez, David Cronenberg passou-se. Haveria muitos prémios a atribuir. Mas nada está a concurso. E o melhor mesmo é ver a sessão: são 34, por amor de Deus, são enormes as chances de gostar muito de algum.



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