quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Cartas fora do baralho


4 Copas, de Manuel Mozos






O trunfo é copas. E cortam-se as vazas como quem despedaça corações. Assim é o filme de Manuel Mozos, 4 Copas, que se estreia dia 20 de Agosto. Quatro são as personagens, que se sentam à volta deste tabuleiro, banal como a vida, onde se delineia o jogo. A banalidade das personagens e situações é, de resto, explícita e deliberada, uma jogada óbvia. Mas todos vão a jogo. O pai vende flippers e outras relíquias lúdicas, num cenário que muito prometia. A madrasta, cabeleireira no Centro Comercial Alvalade, é viciada em cartadas clandestinas e outras jogatanas. O amante (Miguel), agora segurança, também passou por esse antro de perdição, e agora entretém-se com uma consola. Enquanto Diana, a protagonista, joga aos amores. O trunfo é copas, já se disse. E ela seduz o amante da madrasta com o fim de a trazer de volta para o pai, mas acaba por se apaixonar pelo próprio Miguel. Simples e confuso como a trama de uma telenovela. E o filme de Mozos tem mesmo alguns desses traços. Sobretudo peca por uma má gestão das emoções e um guião demasiado explicativo que quebra todos os picos possíveis, ou as escassas hipótese de emoção. Sem surpresas, ou margens de dúvida para o espectador: basta contar os trunfos para adivinhar a próxima jogada.
Não deixa de ser curioso ver que Manuel Mozos, que tanto sucesso tem tido com Ruínas, um documentário que venceu o Indie Lisboa e o Festival de Marselha, consegue agora entrar num registo tão marcadamente antagónico. Ruínas é praticamente despovoado de gente, 4 Copas está superlotado, praticamente não havendo um fotograma sem uma pessoa lá dentro. Ruínas primava pela subtileza, 4 Copas por uma exposição excessiva em cenário urbano.
Em rigor, quem conhece a obra de Manuel Mozos não ficará surpreendido com o cenário. Ficções anteriores, como Quando Troveja (1999) ou Um Passo, Outro Passo e Depois (1992), também decorrem em cenários urbanos, com Lisboa em pano de fundo. E, na verdade, são igualmente histórias banais da banal gente que povoa a cidade. Por isso, além de uma opção narrativa, esta é uma marca do realizador. O que, no caso de 4 Copas, funciona melhor como proposta do que como resultado.
O melhor do filme talvez seja mesmo a actriz, Rita Martins, pela qual Mozos legitimamente se apaixonou. Ou fez com que nos apaixonássemos por ela, através de planos que a engrandecem e quase a divinizam, apesar da sua simplicidade rude. No resto, há demasiados planos fora de jogo. Acima de tudo fica a ideia, até para quem viu Ruínas, que Mozos tem os trunfos do seu lado é capaz de mais e de melhor. E será.

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