quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Eu amo você

A Bela e o Paparazzo, de António-Pedro Vasconcelos





É tão assumidamente disparatado e ingenuamente despretensioso que A Bela e o Paparazzo, de António-Pedro Vasconcelos, chega a ter... graça

A história já quase faz parte da mitologia académica, mas conta-se que um professor de Direito, muito maldosamente, comentou assim a tese do arguente: «A sua tese», disse, «tem coisas boas e coisas originais, só que as originais não são boas e as boas não são originais.» Seria também um pouco maldoso comentar assim a primeira comédia de António-Pedro Vasconcelos que se estreia hoje, 28, com o inauspicioso título A Bela e o Paparazzo e um ainda mais desprometedor cartaz. De facto, o pior do filme é mesmo o pacote, porque aberto o embrulho, extirpados todos os laçarotes de estética pimba e televisiva, o filme nem é lançado à nossa cara como uma tarte peganhenta, último recurso dos humoristas desinspirados. E até os tais momentos não originais – óbvias citações – deslizam bem entre os momentos de stand up autóctone. Como quando a personagem de Nuno Markl usa a raqueta de ténis para escorrer o espaguete, como Jack Lemon, em O Apartamento, de Billy Wilder. Ou aquela cena vai-não-vai-mergulho na Fontana di Trevi, quando a Bela (Soraia Chaves) e o Paparazzo (Marco d’Almeida) descalçam os sapatos e se passeiam pela borda das fontes do Rossio. E o casal até faz uma dança cheek to cheek a atrapalhar o trânsito.

A história cumpre, com alguma competência, as convenções das comédias românticas (o casal impossível que vai acabar junto). Há o quiproquó de alguém que, tentando ser outro, se descobre a si próprio. Mas a grande mais-valia é o tom absurdo com que o argumentista Tiago Santos (com quem António-Pedro Vasconcelos já trabalhara no guião de Call Girl) conseguiu alfinetar o delicodocismo que se receava. O puro disparate, os diálogos, algumas piadas e as T-shirts de Nuno Markl são mesmo o melhor do filme – já agora, há uma que diz «Não me dêem conselhos, dêem-me distritos». No início, teme-se o pior. As personagens parecem todas atacadas por uma crise de epilepsia hiperactiva. Nicolau Breyner, que anda aí a picar o ponto em tudo quanto é filme português, aparece num registo revisteiro que destoa tanto das restantes actuações como uma sardinhada acompanhada de Coca-Cola Zero. De resto, a maior parte das punch lines são ditas no momento certo, não antes das emoções crescerem, mas já não na curva descendente – o que seria fatal. E até há a crítica explícita ao vampirismo – pelos vistos, os vampiros estão a moda – das revistas de fofocas. «Cada país tem as celebridades que merece», diz-se no filme. E a nós só nos apetece acrescentar. Cada país também tem os filmes que merece. Adiante...

Há uma actriz de telenovela que fica encantada quando se vê oficialmente desempregada das novelas da TV – porque aquilo de que ela gostava mesmo era de representar a Nina da Gaivota de Anton Tchekhov. Há um fotógrafo que anda por aí a toupeirar os escândalos, os divórcios e os abortos das vedetas, («os papparazzi são sanguessugas com máquinas de fotógrafos penduradas ao pescoço»), mas do que gostava era de fotografia artística. E uma editora de revistas que come pastéis de nata com uma colherzinha e usa a massa folhada para esmagar o cigarro.

No meio disto tudo, há um ser muito sedentário, do tipo Jabba the Hutt de sofá – o tal Nuno Markl que escorre a massa com a raqueta – que resolve declarar um enclave independentista de Portugal no prédio onde vive, e passa o tempo em discussões constitucionais com estes condóminos-Afonsos Henriques, no Pátio de Santo Antoninho. E que além de ver os clássicos da comédia portuguesa (Vascos Santanas e etc...) cita Monty Phyton, produz umas metáforas engraçadas que envolvem pinguins e faz castings para ministra dos Negócios Estrangeiros a uma japonesa, em função dos casos amorosos do seu currículo mundial. E ainda o melhor de tudo é a música de Jorge Palma, apesar do duvidoso refrão: «Eu não sei bem quem tu és, sei que gosto dos teus pés.» E fica a ideia de que, às vezes, o riso nem é tanto uma emoção. É antes vermo-nos livre dela. O que também dá jeito.

3 comentários:

Vítor Moreira de Carvalho disse...

Para alguém que escreve com tamanha arrogância, a jovem comete um erro fatal: "Monty Python" está mal escrito, como é habitual entre as pessoas que querem parecer que sabem, mas que não sabem por aí além. E isso chega para dizer que... cada país tem os críticos de cinema que merece.

Ana Margarida de Carvalho disse...

Olha, pois está...

A jovem promete tomar mais cuidado com a ortografia que é para não indispor aqueles que parecem mesmo aquilo que são.

Fica corrigido o erro fatal.

Manuel Halpern disse...

Vítor Moreira de Carvalho é pseudónimo de quem?