quarta-feira, 15 de julho de 2009

O rapaz do shopping


Depois de Rapace ter sido o primeiro filme português a ganhar a Competição Internacional em Vila do Conde, João Nicolau, 34 anos, ganha novo prémio, com Canção de Amor e Saúde, confirmando o seu estatuto de favorito. O filme, uma co-produção luso-francesa, já tinha passado pela Quinzena dos Realizadores de Cannes e teve aqui o seu primeiro prémio. Agora, João Nicolau concentra-se na sua primeira longa-metragem, que brevemente vai começar a ser rodada, e nas actividades paralelas de músico e actor.

canção de amor e saúde
canção de amor e saúde



A 15 dias da rodagem, souberam que, para manter o subsídio do Canal Plus, metade do filme teria que ser falado em francês. Tal obrigou a importantes e inesperadas alterações. Foi um mal menor ou um mal que veio por bem?
JOÃO NICOLAU: Acabou por ser um mal que veio por bem. Apesar de ser a segunda cidade do país, não é barato filmar no Porto. Foi necessário trazer o equipamento todo e alojar uma equipa inteira durante aquele período. Por isso, precisávamos mesmo do apoio do Canal Plus. A maneira que encontrei para contornar o problema foi reinventar a história da Marta do Monte, pondo-a a falar francês. Acrescentei apenas duas cenas. Depois foi um trabalho extraordinário dos actores, em tempo recorde. Rodei a segunda parte do filme em português e francês. Depois montei as duas versões e pareceu-me que a francesa era melhor. Por isso nem sequer acabei a outra.

Rapace foi filmado num bairro novo de Lisboa (Telheiras). Porque trouxe Canção de Amor e Saúde para o Porto?
É um filme de estúdio. Já tinha o alinhamento praticamente feito, mas muitas das coisas, como a passagem de um sítio para o outro, foram sugeridas por décors que visitei. Apesar de ser de Lisboa, o Shopping Brasília traz-me memórias: lembro-me de ir lá quando vinha visitar a família ao Porto, era um espaço de diversão. Aquelas foram as primeiras escadas rolantes públicas do país. Quando o visitei, achei que tinha condições para fazer o filme ali. Ao contrário do Rapace, usei movimento de câmara. A própria história é diametralmente oposta: o Rapace fala da impossibilidade do amor. Aqui, apesar deles provavelmente virem de classes sociais diferentes, o amor acontece e o filme até tem um final feliz, o que é um pouco demodé. O Parque de Serralves funciona como um contraponto. Tem aquela relação entre o humano e o natural através da arte contemporânea. Mas é um espaço de Natureza, por oposição à caverna que aparece na primeira parte do filme.

João, o protagonista do filme, usa aquela chave grande para abrir uma porta mágica que o leva ao jardim. Um paraíso?
Sim, aliás, a música instrumental que passa naquela altura chama-se precisamente Paradise. Porque adquire esse significado.

Escolhe novamente um não actor para protagonista. No caso, o Norberto Lobo, que é um músico. Porquê?
A escolha de não actores não é propriamente novidade. Já conheço o Norberto há muitos, muitos anos. Bastante antes de ele ser conhecido como músico. Achei nele o actor certo, porque sei como ele fala e como ele anda. Claro que houve um grande trabalho sobre a personagem. Mas escrevi mesmo a pensar nele.

Algumas cenas do filme assim como o próprio Norberto lembram o João César Monteiro. É propositado?
Espero que este filme esteja um bocado mais distanciado de algumas influências. Reconheço-as e assumo-as, sem problema nenhum, mas não quero ficar demasiado preso a elas. Já percebi que tenho uma tendência para tipos magros e esguios. Às vezes o Norberto parece uma silhueta, como quando entra no centro comercial. Na longa-metragem que estou a fazer, a personagem já não é magra.

Está em fase de filmagem da longa-metragem?
Sim, mas preferia não falar muito do assunto. Estou tão metido lá dentro que não consigo ter distância para reflectir sobre o filme.

Paralelamente é músico dos München, que fazem a banda sonora do filme, e actor, em filmes como Tony, de Bruno Lourenço, que também participa no Curtas de Vila do Conde. É um favor que faz aos amigos ou algo que lhe dá prazer e gostaria de seguir como carreira?
As duas coisas. São casos isolados de amigos que me convidam para participar nos filmes, mas também é uma coisa que me dá prazer e não excluo a possibilidade de fazer mais regularmente. Também está aí [no festival] um filme francês, do Frank Beauvais, que tem música dos München. E no Outono vai sair um novo álbum da banda.

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